20 04 Notícia NotaPrezados amigos catalíticos,
é com grande pesar que comunicamos o falecimento do nosso amigo e sócio honorário Dr. Leonardo Nogueira, ocorrido no dia 15 de abril de 2023. A Sociedade Brasileira de Catálise se solidariza com a comunidade catalítica e manifesta os mais profundos sentimentos a todos os familiares e amigos do Dr. Leonardo Nogueira.

Nossa homenagem a esse grande pesquisador e amigo vai em forma de depoimentos de pessoas que conviveram diretamente com ele.


Homenagem ao Dr. Leonardo Nogueira

Recebi da Sociedade Brasileira de Catálise convite para escrever um texto em homenagem a Leonardo Nogueira, falecido no último dia 15 de abril. Aceitei o convite com um misto de tristeza, por avivar a dor de uma perda, e satisfação, por ter a oportunidade de homenagear uma pessoa que teve importância fundamental em minha vida profissional, além de ter sido um amigo muito estimado.

Outros escreverão em detalhe sobre a rica trajetória profissional e científica do Leonardo, como um dos pilares do estabelecimento de uma comunidade dedicada a catálise no país, na criação e atuação à frente do grupo de catálise do CENPES/PETROBRAS, o primeiro grande grupo de catálise do país, em sua atuação de muitos anos como coordenador da Comissão de Catálise do Instituto Brasileiro do Petróleo, precursora da SBCAT, sua participação em tudo que se relacionava à catálise junto aos órgãos de desenvolvimento científico-tecnológico oficiais no país, sua inserção na comunidade científica internacional. Prefiro concentrar-me na dimensão humana dessa pessoa extraordinária que foi o Leonardo e, em particular, como exemplo de sua generosidade com os que com ele trabalhavam, sua crucial importância em minha vida profissional.

Conheci Leonardo em 1970, quando ele retornou de seu doutorado na Northwestern University com a incumbência de montar no CENPES/PETROBRAS um grupo dedicado à pesquisa, desenvolvimento e serviços técnicos em catálise, dado o reconhecimento por parte da empresa da importância central dos catalisadores nos processos de refino do petróleo. Com um núcleo inicial de três pesquisadores, foi criado o Setor de Catálise da Divisão de Tecnologia de Refino do CENPES, sob a chefia de Leonardo Nogueira. Era evidentemente necessário expandir esse grupo inicial para atender às necessidades da área, porém era virtualmente inexistente no país na época fonte de recursos humanos especializados em catálise. Foi então estabelecido, graças ao contato de Leonardo com o Prof. Cláudio Costa Neto do Instituto de Química da UFRJ, um Curso Avançado em Química de Processos Catalíticos, reconhecido a nível de mestrado pelo IQ/UFRJ, para o qual foram convidados a ministrar cursos grandes expoentes da catalise, a nível mundial na época, incluindo os Profs. Hermann Pines e Robert Burwell da Northwestern University, e o Prof. Michel Boudart de Stanford University, sendo os créditos completados pelos professores regulares do curso de pós-graduação do IQ/UFRJ, além do próprio Leonardo Nogueira. Quando se estabeleceu o CAPROC, eu era responsável pelo Laboratório de Espectrometria de Massas, da Divisão de Química do CENPES e, dentro do grande esforço no CENPES em aumentar a capacitação técnica de seus profissionais, havia sido indicado para cursar mestrado no IQ/UFRJ. Inscrevi-me então no CAPROC e meu orientador de mestrado foi o Dr. Leonardo Nogueira, envolvendo a dissertação a aplicação da técnica de espectrometria de massas a um problema de interesse catalítico. Esta foi então a primeira grande contribuição do Leonardo a minha vida profissional.

O CAPROC tinha, no corpo discente, além dos pesquisadores que formavam o núcleo do Setor de Catálise, diversos outros estudantes, muitos dos quais em seguida se incorporaram ao CENPES, entre os quais nossa querida Ruth Martins. Eu mesmo, pouco tempo depois, transferi-me da Divisão de Química para o Setor de Catálise. Trabalhei sob a chefia do Leonardo na área de catálise do CENPES desde 1976 até sua aposentadoria em 1990. Foram 14 anos de uma relação profissional extremamente harmoniosa.

Com a crescente percepção da PETROBRAS da importância estratégica dos catalisadores e crescente capacitação da equipe dedicada à catálise, o Setor de Catálise foi elevado ao status de Divisão de Catálise em 1978. Na época, o único profissional com nível de doutorado na equipe era o próprio Leonardo Nogueira, que, no entanto, vislumbrava a necessidade de contar com maior número de profissionais com formação acadêmica mais aprofundada na área. Dois pesquisadores foram então escolhidos para cursar doutorado no exterior, entre os quais o autor do presente documento. Foi uma luta renhida o convencimento da diretoria apropriada da PETROBRAS a aceitar a ideia de patrocinar doutorado no exterior de um de seus técnicos. Isto ocorria na área de exploração e produção de petróleo da companhia, mas não era bem aceito na área de refino. Leonardo empenhou-se muito em resolver a questão, e acabei viajando para a Escócia para cursar meu doutorado na University of Edinburgh. O empenho de Leonardo me levou a escrever, nos agradecimentos de minha tese de doutorado, um a ele, que dizia: “definitely someone to have at your side in a fight”. Ter obtido o título de doutor em 1984 abriu-me oportunidades, que vieram a ser exploradas quase dez anos anos depois, quando de minha aposentadoria da PETROBRAS.

Dentre as importantes contribuições de Leonardo Nogueira ao desenvolvimento da catálise no Brasil, figura sua atuação como coordenador da Comissão de Catálise do IBP, precursora da atual Sociedade Brasileira de Catálise. Leonardo foi coordenador desde a criação da Comissão no início dos anos 80 até 1992, quando o sucedi. Esta longevidade de Leonardo no posto é uma demonstração de seu prestígio junto aos catalíticos brasileiros, já que o coordenador era escolhido bienalmente pelos membros da Comissão, que reunia os principais pesquisadores da academia, da indústria e centros de pesquisa institucionais de todo o país. Na gestão de Leonardo Nogueira foram realizados, a cada dois anos desde 1981, seis dos Seminários Brasileiros de Catálise, hoje Congressos Brasileiros de Catálise. Foi além disso publicado um até hoje utilíssimo Manual de Caracterização de Catalisadores e foram organizados regularmente cursos de catálise, que tiveram grande procura por parte da academia e da indústria.

Após sua aposentadoria da PETROBRAS em 1991, Leonardo associou-se por alguns anos ao Departamento de Físico-Química do Instituto de Química da UFRJ, como professor convidado, atividade que dividia com sua grande paixão esportiva, a natação master. Data desta época mais uma das contribuições inestimáveis de Leonardo a minha vida profissional. O DFQ estava empenhado em estabelecer uma linha permanente de pesquisa em catálise e lançou edital de concurso para contratação de um professor pesquisador para a área. Na época, eu estava recém-aposentado da PETROBRAS e não fazia parte de meus planos começar uma carreira acadêmica àquela altura, mas Leonardo me estimulou a participar do concurso, no qual acabei por ser aprovado, o que me proporcionou mais 25 anos de enriquecedora carreira universitária.

Como se vê, este que escreve o presente documento tem razões de sobra para ser imensamente agradecido a Leonardo Nogueira, em testemunho de sua disposição em apoiar aqueles que com ele colaboraram, desde que evidentemente demonstrassem algum mérito para tanto.

Leonardo foi um líder natural, e exerceu liderança em todas as atividades em que se envolveu; na PETROBRAS, na Comissão de Catálise do IBP, entre os aficionados da natação master, etc. Era antes de tudo um agregador, cujo prestígio, ao contrário do que frequentemente ocorre, nunca se traduziu em arrogância, soberba, autopromoção, Como chefe, exercia sua liderança por meio de seu entusiasmo, pelo estímulo a seus subordinados e sua grande lealdade a eles. Era admirado, respeitado e querido. Quando de sua aposentadoria, por iniciativa de seus subordinados, foi inaugurada uma placa em sua homenagem, fato que, até onde eu saiba, permanece único no CENPES. Lembro-me que, a inauguração, à qual compareceu com sua esposa Delta, foi uma surpresa para ambos. E ao ver a placa, Delta, que rivaliza com Leonardo em simpatia e simplicidade, exclamou: “Xi, vão emplacar o Leonardo!”

É isso, meu caro amigo. Muito obrigado pelo tanto que você representou na vida de tanta gente, da qual eu sou apenas um exemplo.

Arnaldo Faro


Adeus a Leonardo Nogueira

Queridos amigos catalíticos,

A pedido da diretoria da Sociedade Brasileira de Catálise e em seu nome, venho apresentar esse breve texto que é nossa despedida ao grande nome da Catálise, Leonardo Nogueira.

Leonardo Nogueira graduou-se engenheiro químico pela Escola Nacional de Química da Universidade do Brasil em 1954. Ingressou em seguida na Petrobrás, tendo concluído mestrado profissionalizante promovido pela empresa em 1956. Trabalhou sempre com pesquisa e desenvolvimento, tendo sido um dos fundadores do CENPES (Centro de Pesquisas da Petrobrás). Em sua busca incessante por conhecimento, conseguiu patrocínio para estudar nos EUA, tendo concluído o mestrado em Química pela Northwestern University (1968), e a seguir o doutorado em Química (Catálise) também pela Northwestern University (1970). Em ambas as teses foi orientado pelo ilustre professor Herman Pines, um dos maiores nomes da Catálise mundial em todos os tempos. Foi o primeiro PhD em Catálise do Brasil, defendendo uma brilhante tese intitulada “Contribution to the Mechanism of Aromatization of N-Heptane-1 over non-acidic Platinum-alumina Catalyst. Parte II - Hydrogenolysis of 1,1-Dimethylcyclopropane and Ethylcyclopropane in the Presence of Nickel Catalysts.”

Ao voltar ao Brasil, lutou bravamente para introduzir a área de Catálise na Petrobrás. Como fruto de sua perseverança, a Petrobrás criou no CENPES a Divisão de catálise, da qual foi ele o primeiro chefe. Participou ativamente de todos os importantes eventos de Catálise no Brasil. Graças ao seu incentivo, O Instituto Brasileiro de Petróleo criou a Comissão de Catálise no final dos anos setenta, sendo Leonardo seu primeiro coordenador. Essa Comissão foi o embrião do que é hoje a sociedade Brasileira da Catálise, da qual foi fundador. Também participou da criação dos Congressos Brasileiros de Catálise, e foi presidente do Congresso Iberoamericano de Catálise em 1990. Aqueles que estiveram nesses eventos lembrar-se-ão, com certeza, das famosas e ruidosas palmas do Leonardo, com as quais indicava a todos que o “coffee break” estava animado...mas que era tempo de voltar ao trabalho!

Era um verdadeiro entusiasta da ciência e da Catálise. Lembro-me com saudade dos fins de tarde em sua sala, quando eu lhe mostrava meus últimos resultados obtidos e ele, interessado, apresentava sugestões. Lia e comentava nossas produções e publicações, adicionando sempre comentários incisivos e inteligentes. Não era apenas um gerente tradicional. Era também um pesquisador, que vibrava com os resultados de seus subordinados. A Catálise era indubitavelmente sua vida e sua paixão.

Um anjo intrometido contou-me que hoje Leonardo bateu na porta do céu. São Pedro, carrancudo, veio atender. Olhou-o de cima a baixo e, peremptório, fez a temível pergunta:
“- O que fez você na vida para merecer o Reino dos Céus?”
Leonardo, modesto, mas sagaz e articulado, respondeu com sinceridade:
“- Não fiz muito, meu santo. Sempre trabalhei e estudei muito. Encarei com humildade os desafios que a vida me apresentou, sem aceitar derrotas fáceis. Acima de tudo, aprendi a catalisar. A catalisar amizades, a catalisar o desenvolvimento da ciência, a catalisar o futuro de jovens pesquisadores e alunos. Também soube, junto de minha parceira de toda uma vida, Delta, catalisar a formação e crescimento de uma bela família. Finalmente, meu santo, acho que minha maior obra foi catalisar...a própria Catálise no Brasil!”

A cara de São Pedro então desanuviou-se e santo abriu um largo sorriso. Emocionado (sim, os santos também se emocionam), retrucou com um brilho de lágrima nos olhos:
“- Passe adiante, Leonardo Nogueira. Seu trabalho foi notável. Aqui precisamos de gente como você. Continue sua missão, catalisando esperança, levando luz e conhecimento àqueles que deles precisam. Siga sendo justo, honesto nos seus princípios, amigo de seus amigos, parceiro daqueles que buscam se melhorar pelo esforço e estudo. Seja sempre você, doravante eternamente. Assim na Terra, como no Céu!”
Finalmente, quando Leonardo já preparava sua caminhada pelos Campos Elísios, São Pedro o chamou e, piscando o olho, disse:
“- Mais tarde vou querer que você me explique o que é essa tal de energia de ativação...”.

Eduardo Falabella de Sousa-Aguiar


Leonardo sempre foi meu ídolo como uma pessoa, um líder e um cientista. Ele é um modelo para mim como um Brasileiro deve ser: ativo, positivo, equilibrado e sempre com consideração para outras pessoas com calor humano.

Ele deixou muito legado, no trabalho e na família. Todos foram criados com excelência e amor, como ele sempre exigiu.

Ele não está mais conosco fisicamente, mas em nossa mente, ele sempre ficará: um amigo, professor e motivador.

Um grande abraço,

Yiu Lau Lam

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